Não sou ninguém, o meu trabalho é nada
Neste enorme rolar da vida cheia,
Vivo uma vida que nem é regrada
Nem é destrambelhada e alheia.
***
Dormi. Sonhei. no informe labirinto
Que há entre a vida e a morte me perdi.
E o que, na vaga viagem, eu senti
Com exacta memória não sinto.
Se quero achar-me em mim dizendo-o, minto.
A vasta teia, estive-a e não a vi.
Obscuramente me despercebi.
***
Ah, deixem-me sossegar.
Não me sonhem nem me outrem.
Se eu não me quero encontrar,
Quererei que outros me encontrem?
***
No chão do céu o Sol que acaba arde.
Durmo. Haja a vida com ou sem alarde,
Será já tarde quando eu despertar?
Mas que me importa que já seja tarde?
***
SE PENSO mais que um momento
Na vida que eis a passar,
Sou para o meu pensamento
Um cadáver a esperar.
(...)
Por mais que o Sol doire a face
Dos dias, o espaço mudo
Lembra-nos que isso é disfarce
E que é a noite que é tudo.
Novas poesias inéditas - Fernando Pessoa.
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